terça-feira, 1 de outubro de 2019

PEDRO NAVA


   Rua da Glória, 190  - Glória   

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Pedro Nava
- Pedro da Silva Nava - (1903 - 1984) , médico e memorialista, ilustrador nasceu , na cidade mineira de Juiz de Fora. No início dos anos 1920, mudou-se para Belo Horizonte. Ali, por volta de 1925, publicou poemas,em A Revista. Estudou Medicina, formando-se em 1927 pela Universidade de Minas Gerais e em 1929 chegou a ter ilustrações suas numa edição de Ma­cunaíma, do amigo Mário de An­drade, com quem se correspondeu durante muitos anos, e que identificava em seus versos uma “sun­tuosidade artística”.


Antes de estabelecer seu consultório no Rio de Janeiro, onde também era professor universitário, o doutor Nava clinicou em Juiz de Fora, Belo Horizonte e Monte Aprazível. Ao longo de cinqüenta anos de exercício profissional, assumiu um lugar de destaque na medicina brasileira ao se tornar o pioneiro de uma especialidade que ele trouxe para Brasil depois de um estágio na Europa, nos anos 1940: a reumatologia, da qual foi considerado o melhor de seu tempo.

Escreveu dezenas de artigos, ensaios e livros sobre temas médicos. Tomando a decisão de se aposentar - o abandono da carreira médica só ocorreu em função do início de uma deficiência auditiva -  fechou o consultório para se dedicar integralmente à paixão que o acompanhou desde a juventude: a literatura.

Em 1972, publica pela Editora Sabiá seu primeiro volume de memórias: Baú de ossos, em que narra a história de seus antepassados portugueses, italianos, cearenses e mineiros. Muito mais que isso, o livro não se limita a descrever episódios vividos pelo autor: revela o ambiente social, político e cultural do Brasil na primeira metade do século, levando o leitor a compreender, mais do que o homem, a época em que viveu.  Como ninguém brincava com as palavras.

“Batida, no Ceará, é uma rapadura especial, feita com melado sovado e arejado a colher de pau, até o ponto de açucarar. Com que também perde o gosto de rapadura. Vira noutra coisa, devido à versatilidade do açúcar, que é um em cada consistência, e que é ainda um a quente e outro a frio. Que é ainda ostensivo ou discreto, acessório ou predominante, substantivo ou adjetivo segundo se combine ao duro, ao mole, ao líquido, ao pulveru­lento, ao pastoso, ao espumoso, ao sol e ao gel. Compor com açúcar é como compor com a nota musical ou a cor, pois uma e outra variam e se desfiguram, configuram ou transfiguram segundo os outros sons e os outros tons que se lhe aproximam ou avizinham. É por isso que tudo que se faz com açúcar ou se mistura ao açúcar pede deste a forma especial e adequada – que favoreça a síntese do gosto.”

Sua estréia como memorialista, aos 69 anos, foi saudada pela crítica, e continha um detalhe curiosos: ele só escrevia a mão. Baú de ossos começa com um traço inconfundível da mineiridade:

“Eu sou um pobre homem 
do Caminho Novo das Minas 
dos Matos Gerais”

Seguiram-se quatro livros lançados pela  Editora José Olympio, a editora do velho amigo e vizinho: 

Balão cativo (1973), relembrando a infância em Juiz de Fora e a vida no bairro carioca do Rio Comprido; Chão de ferro (1976), em que o escritor conta sua adolescência; Beira-Mar (1978), que termina no momento em que Nava revela a aspiração de dedicar-se à medicina; e Galo-das-trevas (1981), que fala sobre sua clínica em Belo Horizonte, Caeté, Juiz de Fora e a Revolução de 1930. “Cera das Almas” (2006),  foi publicado postumamente e incompleto.

Sua obra memorialística foi considerada com um estilo sóbrio e elegante. Dono de um dos textos mais elaborados da prosa brasileira, Pedro Nava, tinha


"a minúcia descritiva e a arguta propriedade vocabular 
... recursos para identificar, através de cada pormenor, 
o sentido específico da coisa, a ‘alma do negócio". 
Carlos Drummond de Andrade



O talento de Pedro Nava para as artes plásticas é desconhecido do grande público, mas o escritor só não avançou nessa carreira porque não quis. Na juventude, fez ilustrações para livros, como  para "Macunaíma" de Mário de Andrade,  em 1928. Na composição de seus livros, o desenho era ferramenta poderosa. Nas páginas da direita de seus originais, Nava ilustrava suas memórias com mapas, detalhes das casas onde morou, caricaturas de personagens citados nos livros e revolvidos no baú de memórias do autor.

Pedro Nava era descrito pelos amigos como modesto, acessível, generoso, falante e bem-humorado. Deixou uma obra grandiosa, interrompida pela morte trágica, cuja motivação provavelmente nunca será conhecida.


Pedro Nava foi nosso vizinho ilustre não só na Glória onde passou a residir a partir de 1943  quando casou - Rua da Glória, 190 , 7° andar.

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mas também na Tijuca, sua primeira residência quando chega ao  Rio de Janeiro, em 1916,  e vai morar na Rua Haddock Lobo, 252, em companhia dos tios ( casa já demolida).



Pedro Nava teve uma companheira por muitos anos, Antonieta Penido Nava (D. Nieta)  com quem casou em 29 de junho de 1943. Segundo o próprio Nava, casou-se “tardiamente, aos 40 anos, porque era um boêmio que gostava de aproveitar a vida com liberdade”.

Nava e Nieta - foto de 1980

Uma morte trágica e inesperada interrompeu a trajetória do memorialista. Cometeu suicídio com um tiro na cabeça no dia 13 de maio de 1984. Embora a imprensa da época tenha tentado encobrir o fato, tudo indica que o ato seria decorrente da chantagem feita por um garoto de programa. Após receber uma misteriosa ligação telefônica, Pedro Nava comenta com a mulher "Nunca ouvi nada tão aviltante" . Foi para uma praça do bairro Glória, no Rio de Janeiro, e decretou o fim de sua vida. Aos 80 anos, com um tiro na cabeça, o escritor se matou.


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Pedro Nava ao lado do relógio da Glória

"Sim, tenho saudades 
Sim, acuso-te porque fizeste o não previsto 
nas leis da amizade e da natureza 
nem nos deixaste sequer o direito 
de indagar porque o fizeste, 
porque te foste."

Trecho da poesia, A Um Ausente,
de Carlos Drummond de Andrade, homenagem ao amigo Pedro Nava

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